segunda-feira, outubro 04, 2004

FOME de CONVERSA

Conheci-o há menos de um mês; acidentalmente –digo eu…-, no café do Marques, já estava a preparar-me para pagar a bica quando ouvi uma voz por cima do ombro a perguntar-me delicada e pausadamente se podia sentar-se, que as mesas estavam todas ocupadas. Que sim, respondi , acrescentando «já estou de partida, é só pagar…». Sentou-se. Era um sujeito seco de carnes , alto e devia andar pelos trinta e muitos. Deitou um olhar pela primeira página do meu jornal e disparou: «Esse Blair, é tão aldrabão como o outro…o Bush. Andaram na mesma escola politica: invadem o Iraque sem pedirem licença a ninguém e é o que se está a ver…e o Durão, a fazer de aprendiz de feiticeiro...Não concorda comigo?» Que eu concordasse ou não, pouco lhe devia importar porque continuou a dissertar sobre o tema, passou sem respirar para o futebol, andou pela abertura do ano escolar e por aí fora…Só me permitiu uma folga para eu falar com a Joana a dizer-lhe que «estava um bocadinho demorado mas que não tardava nada estava em casa para o almoço…»

Nesse sábado, de sol quente a protelar teimosamente a chegada do Outono almocei a uma hora pouco usual para os meu hábitos (tardia, pois claro!), porque o Floriano, assim é a graça deste cidadão, insistiu em contar-me a vidinha tim-tim-por-tim-tim até ao momento em que chega a Almada –por via da profissão-, e onde espera ficar durante uns anos largos , quem sabe até assentar arraiais definitivos, que a cidade lhe parece acolhedora e os habitantes não menos…E não parava; de quando em vez questionava-me… e sem esperar pela resposta, aí estava ele na escalada terrorista que assola o mundo ou no preço dos combustíveis que não pára de aumentar… e por aí fora. E deleitava-se (adivinhava-se-lhe nos olhos), por congeminar sobre tão intrincados assuntos e o seu registo de voz emitia um tom de confidencialidade como se eu representasse um amigo de longa data e escutasse uma conversa interrompida no dia anterior. Insistiu em pagar-me o café e em que voltássemos a encontrar-nos pois ficou encantado com o “diálogo” e com os meus pontos de vista…

Confesso que depois deste encontro , deixei de frequentar o café do Mendes; e todo o cuidado é pouco para evitar o Floriano à saída de uma esquina. Se isso acontece evoco motivos urgentes e inadiáveis para me libertar apenas com um “olá, como está?” e raspar-me. Vejo-o a falar, ora entusiasmado, ora pesaroso, de gesto largo e voz sonora, com gente daqui que parece conhecer desde sempre. Auguro-lhe um futuro risonho na coisa política. Quem sabe se não será o próximo presidente da junta de freguesia cá do sítio?! Intés!!
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