quarta-feira, outubro 13, 2004

LUGAR SENTADO

Mal tinha acabado de mostrar o passe ao condutor do autocarro, logo uma jovem sentada num daqueles lugares para idosos, inválidos, pessoas com crianças ao colo e grávidas, se levantou solícita e me ofereceu o seu assento. Hesitei, surpreendido e embora deixasse escapar um "deixe estar, obrigado", acabei por me sentar; afinal o carro até estava cheio...

Apesar de curto e enquanto durou o percurso até casa, uma indiscritível confusão de sentimentos (e preocupações existenciais) não deixaram de me assaltar o bestunto. Não tinha mudado de sexo, logo (e milagrosamente) não estava grávido; não cambaleava trôpego ou me socorria de bengala; por via de qualquer fractura, nem usava canadianas (prefiro, aliás, argentinas que são muito mais práticas para dançar o tango...). Por causa das dúvidas, através do vidro que separava o meu lugar do habitáculo do motorista, à contraluz, analisei detida e disfarçadamente o meu rosto. Estava como sempre: ar jovial, sorriso irónico e sem sinal que pudesse ser suposto tratar-se de um idoso convicto, assumido e militante. Então o porquê do gesto?; a jovem teria problemas de visão?; foi a sua primeira acção escuteira do dia e quem entrasse naquela altura tinha lugar sentado garantido?.

Interrogações que ficaram sem resposta. Certo é que há sempre uma "primeira vez" e provavelmente nem dou (ou não quero dar), pelo tempo que passa: sem se deter. Intés!!
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